O livro é melhor do que o filme.
Clichê habitual de leitores que até despendem algum tempo com a sétima arte,
mas não admitem comparações com as obras literárias que lhe deram origem. Há quem
aguarde avidamente que haja algum comentário sobre determinados filmes para,
estufando o peito, olhar disperso e com fingida despretensão declarar:
— Até que é legal, mas o livro é muito melhor.
Em grande parte das vezes, os
presentes durante tal ponderação, hão de concordar. A discussão, entretanto,
acaba por ir mais além, não apenas até a qualidade individual dos elementos,
mas sim aos recursos de cada meio.
Um filme, com geralmente um
espaço temporal muito mais limitado, poderia dispor de uma riqueza de detalhes,
da poética e a beleza das disposições de frases brilhantemente enumeradas uma
após outra? Indubitavelmente, trata-se de uma árdua e nem sempre exitosa
tarefa. Ainda assim, quando se alcança um objetivo digno de louvor, sempre
haverá alguém com tendências de pedantismo a fazer o clássico comentário em
desfavor do filme.
Um ilustre exemplo (existe uma
miríade deles!) de que em ambas as mídias a obra pode se tornar grandiosa nota-se
no caso de Lolita. Vladimir Nabokov
publicou seu consagrado romance em 1955. Entre tantos reconhecimentos, há de se
ressaltar que ele inúmeras vezes figura nos primeiros lugares de listas de
melhores livros do século XX, algumas ocasiões, até mesmo em primeiro.
Revolucionário em vários aspectos, polêmico e leitura essencial, intrigante e
envolvente.
Já o filme Lolita, dirigido pelo também consagrado Stanley Kubrick apenas sete
anos depois do romance, em 1962, tem o que se costuma chamar de aclamação
universal por parte da crítica especializada. Atuações memoráveis de James
Mason, como o protagonista Humbert Humbert, e, principalmente, de Peter
Sellers, como Clare Quilty. No entanto, a versão cinematográfica apresenta um
ponto recorrente àqueles que avidamente buscam uma falha a ser apontada: o
roteiro contém várias diferenças em relação ao livro.
Esse detalhe é muito mais digno
de análise do que de críticas negativas, tendo em vista que os acontecimentos
“dissonantes”, na verdade se encaixam perfeitamente no contexto criado. Além
disso, o roteiro foi escrito pelo próprio Nabokov. Aos que não procuram defeito
ou aos que não tem a necessidade pungente de comparações desnecessárias para
dizer o que é melhor ou pior sobra o deleite de saborear boas obras em qualquer
mídia que sejam publicadas.
por Marcelo Mendonça
por Marcelo Mendonça